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Guarnieri: “nunca me desliguei da vida e nem desse povo que está aí”

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Em artigo alusivo aos 14 anos da partida de Gianfrancesco Guarnieri, Valério Bemfica, presidente do Centro Popular de Cultura (CPC) da UMES-SP, destaca o papel fundamental desempenhado por este “filho de militantes antifascistas obrigados a fugir do regime de Mussolini” na cultura brasileira. O autor lamenta o “estrondoso silêncio” sobre a obra desse grande artista popular.

“(…) Junto com Oduvaldo Vianna Filho funda, em 1955, o TPE, Teatro Paulista do Estudante. Em 1956 o grupo se funde com o Teatro de Arena, de Zé Renato, dando início à grande revolução do Teatro Brasileiro. Juntam-se a eles Augusto Boal, Chico de Assis, Flávio Migliaccio, Milton Gonçalves, entre tantos outros, e o Brasil toma os palcos com sua cara, sua gente, seus problemas, suas alegrias.”

Com vocês Guarnieri, por Valério Bemfica.

 

Mas é o mar!

VALÉRIO BEMFICA

Publicado no Jornal Hora do Povo

 

No último dia 22 de julho completaram-se 14 anos do falecimento de Gianfrancesco Guarnieri. Em 6 de agosto do ano passado o brasileiríssimo milanês teria completado 85 anos. Tais datas foram lembradas com um estrondoso silêncio. Reportagens não foram produzidas pelos jornalões. A academia não realizou seminários. Nenhum de seus textos ganhou alguma montagem significativa. As “otoridades” culturais não emitiram notas nem distribuíram comendas.

Quem imaginaria o autor que – aos 21 anos! – entregou ao Brasil uma das obras seminais da dramaturgia nacional, Eles Não Usam Black-Tie, sendo vítima de tal desfeita? Trazendo o povo ao centro do palco, a peça transformou o teatro brasileiro, mas também a Guarnieri: “Logo após a estreia de Eles Não Usam Black-Tie, no Teatro de Arena, que foi um enorme sucesso, eu fui chamado para uma homenagem. Naquele momento, eu fiz um juramento para mim mesmo, um pouco bombástico, mas fiz: a de que eu jamais, jamais trairia a causa de usar a minha arte para defender o povo.[1]

A trajetória que o conduziu a tal juramento vinha sendo forjada há tempos. Filho de militantes antifascistas obrigados a fugir do regime de Mussolini, cedo somou-se às fileiras da União da Juventude Comunista. Nos morros do Rio de Janeiro conheceu as Romanas e os Gimbas de carne e osso, que depois inspirariam seus personagens. Foi presidente da AMES-RJ (Associação Metropolitana dos Estudantes Secundários), vice-presidente da União Brasileira dos Estudantes Secundaristas e, já em São Paulo, secretário-geral da União Paulista dos Estudantes Secundaristas. Promovido ao Partido, foi organizar bases populares e operárias. “Abalar o capitalismo, sem dúvida alguma é a única forma de o homem poder sobreviver. Senão não sobrevive.[2]

Ao mesmo tempo, o chamado do teatro era forte. Junto com Oduvaldo Vianna Filho funda, em 1955, o TPE, Teatro Paulista do Estudante. Em 1956 o grupo se funde com o Teatro de Arena, de Zé Renato, dando início à grande revolução do Teatro Brasileiro. Juntam-se a eles Augusto Boal, Chico de Assis, Flávio Migliaccio, Milton Gonçalves, entre tantos outros, e o Brasil toma os palcos com sua cara, sua gente, seus problemas, suas alegrias. “porque, desde moço, o que eu queria fazer era teatro nacional, entende? O teatro nacional brasileiro.[3] Além do Black-Tie surgem naquele período, da pena de Guarnieri, Arena Conta Zumbi e Arena Conta Tiradentes, em parceria com Boal. Mesmo com todo o cerco ao qual o teatro brasileiro – em particular aquele feito em grupos como o Arena, o Opinião e o Oficina – era submetido pela censura, Guarnieri continua escrevendo e produzindo. Em Um Grito Parado no Ar denuncia a asfixia sofrida pelo teatro e a tortura contra os defensores da liberdade. Em O Botequim constrói uma metáfora da realidade nacional contando a história de um grupo preso em um bar por causa de uma tempestade que não termina. A morte de Wladimir Herzog vem ao palco em 1976 com Ponto de Partida, que contava a história de um pastor encontrado misteriosamente enforcado. Em Janelas Abertas narra a visita de um militante popular ao filho – a clandestinidade o impedira de conhecer antes a criança.

Foram, enfim, mais de duas dezenas de peças escritas. Em todas elas, uma contundência e coerência admiráveis: “Estou sempre com a cabeça nisso. Como é esse negócio de ser povo. (...) E conhecer também este grande contraste – como é que sobrevivem alguns valores incríveis do ser humano, a solidariedade, o companheirismo, a confraternização, por exemplo, em um mundo tão cheio de privações e dificuldades? Porque o povo está sempre disposto a se ajudar. Você sempre encontra solidariedade entre o povo, e eu fui atraído por isso desde cedo. Meu desafio como autor foi sempre o de retratar este povo, procurando identificar a consciência do que ele representa como povo.[4]

Mas Guarnieri foi ainda mais do que isso. Além de autor e diretor, foi também um grande ator. No Black-Tie, como Tião (no teatro) e como Otávio (no filme de Leon Hirszman), como Zeca (em O Grande Momento, de Roberto Santos), como Perus (em O Jogo da Vida, de Maurice Capovilla) deixou sua marca inconfundível em quase uma centena de produções no teatro, cinema e televisão. Talvez duas palavras sintetizem seu sucesso na função: alegria e consciência. O trabalho nunca é um fardo: “O palco nunca foi para mim um local de sofrimento. É engraçado porque eu ouço alguns artistas dizerem que sofrem muito, que o processo de criação é muito dolorido, mas comigo isso não ocorre. Cinema, teatro e televisão, para mim, não têm nada de sofrido, eu não consigo ir para o palco e dar de cara com o sofrimento.[5] E requer plena consciência do que se está fazendo: “Existe um conteúdo a ser transmitido, e o conteúdo é o mais importante.[6]

Qualquer retrato de Guarnieri ficaria incompleto se não abordasse sua faceta de genial compositor. Filho de um Maestro e uma harpista, soube unir como poucos a música ao teatro. Em 2009 tivemos a felicidade de lançar, pela Gravadora CPC-UMES, o CD Um Grito Solto no Ar – A Música Teatral de Gianfrancesco Guarnieri, com a cuidadosa produção de Heron Coelho e a interpretação para lá de marcante de Georgette Fadel. O CD conta ainda com as participações, entre outros, de Carlos Lyra, Francis Hime e do próprio Heron – parceiros musicais, e de Myriam Muniz e Iná Camargo Costa, parceiras de palco e de vida. Nele escutamos, em obras como Mesa de Bar, Upa Neguinho, Feio Não É Bonito, o mais perfeito exemplo de músicas que, surgidas no palco, a ele sobrevivem e a ele extrapolam, fixando-se soberanas no repertório clássico da MPB.

Poderíamos ainda falar do militante destacado nas lutas contra a censura, pela anistia e pelas Diretas Já, ou do primeiro Secretário Municipal de Cultura de São Paulo no período da redemocratização, olhando para a periferia sem preconceito, escutando suas demandas e dando voz aos seus artistas. Ou das inúmeras histórias que o retratam como pai amoroso, amigo fiel e colega leal. Mas isso nos afastaria demais do segundo objetivo deste texto (o primeiro, claro, é recordar Guarnieri): tentar encontrar os motivos de tão ensurdecedor silêncio sobre ele.

Vivemos tempos estranhos”, não se cansa de repetir um membro da mais alta magistratura brasileira. Deveras. Há um ano e meio que arte e cultura viraram palavrão nas hostes (ou seriam hordas?) do governo central. Não contentes com a extinção do MinC, à Cinemateca Brasileira, tentam matar por inanição. Na Fundação Cultural Palmares, nomeiam um capitão do mato. A Funarte é entregue a um rapagão do gabinete do Carluxo. Os cargos no Iphan são distribuídos para blogueiras de turismo. A Fundação Casa de Rui Barbosa, depois de entregue a uma roteirista de segunda linha, é ameaçada de extinção. Isso para ficar só nas barbaridades que nos vieram à memória. Para conduzir o processo de extermínio destas incômodas instituições são escalados proto-nazistas, namoradinhas decaídas, ex-galãs da Capricho, sob a batuta de um ministro laranja. Mais do que estranhos, tristes tempos... O feio quer se passar por bonito.

Não é preciso pensar muito para descobrir o porquê de nossas “otoridades” federais ignorarem aquele que tornou-se “o inconfundível porta-voz de uma gigantesca parcela da sociedade que sempre viveu a quilômetros de qualquer título de nobreza: os pobres, os favelados, os operários, os sedutores malandros do morro, os comunistas, os perseguidos pelos regimes políticos sangrentos, as prostitutas, os grevistas e mais uma infinidade de desamparados sociais a quem ele reservou um abrigo acolhedor que, mesmo sujeito a intempéries econômicas, políticas e sociais, nunca teve telhado de vidro: o palco.[7], nas palavras de Sérgio Roveri, autor do livro-entrevista sobre ele na Coleção Aplauso, que aqui citamos várias vezes. Guarnieri é a antítese do bolsonarismo. Simples assim.

Mas o que dizer da imprensa, da academia, da classe artística? Por certo não podemos acusá-los de – majoritariamente – convir com as opiniões e práticas bolsonaristas. Ao contrário, geralmente são alvo da boçalidade reinante no governo federal. Tudo o que envolva pensamento, humanismo, liberdade é logo incluído no rol dos inimigos pela turma do Bozo. Pensemos um pouco sobre as razões desse cruel olvido. Comecemos pelas piores hipóteses.

A primeira delas pode ser o ranço ideológico. Guarnieri nunca teve medo de expressar suas posições. Em suas próprias palavras: “É verdade que sempre me interessei muito por política e que atuei como militante comunista em muitos momentos da história de nosso País, dentro de minhas reais possibilidades, com absoluta honestidade. Jamais fui tentado a sacrificar meus princípios em nome de desilusões ou interesses pessoais. Portanto, minha trajetória, política e profissional, me satisfaz. Desde cedo, me posicionei ao lado das grandes massas oprimidas, de cujos valores compartilho.[8]

É difícil para alguns admitir a dimensão de um artista militante. No máximo admitem que Guarnieri foi um grande artista apesar de comunista. Presumem uma suposta neutralidade do artista, pregam uma falaciosa liberdade absoluta que, na realidade, não passa de falta de compromisso e alienação. A militância, acreditam, diminuiria a arte. Pura balela. A verdade é que a arte de Guarnieri só foi tão profunda, tão rica, tão intensa porque ele era comunista. Como Leon Hirszman, como Vianinha, como Denoy de Oliveira, como Graciliano Ramos, Portinari, Cláudio Santoro, Nelson Pereira dos Santos, apenas para ficar em alguns dos que já se foram. “Sabe por quê? Porque eu nunca me desliguei da vida. Isso é fundamental. E nunca me desliguei desse povo que está aí. E isso eu digo com orgulho muito grande. Minha cabeça e meu coração estiveram sempre do lado desse povo... E não é por demagogia... É por um profundo amor. Sem dúvida...” explica, de viva voz, Guarnieri na abertura do CD de Georgette Fadel. Nunca se desligar da vida, manter a cabeça e o coração ao lado do povo, nutrir por ele um profundo amor: esse é o retrato do artista militante. Manter algum ranço em relação a isso, não achar que seja possível ou sincera uma postura como a de Guarnieri, é insistir no caminho que levou o Brasil a sua trágica situação atual.

A segunda hipótese é a incapacidade de alguns em reconhecer a centralidade dos movimentos artísticos surgidos no Brasil a partir dos anos 30 do século passado, que foram abatidos covardemente pelo golpe de 64, e dos quais Guarnieri foi um dos principais protagonistas. Com a Revolução de 30 o Brasil começou a se libertar das amarras da dependência dos interesses ingleses e norte-americanos. Industrialização, direitos trabalhistas, voto universal, crescimento da educação e da saúde públicas, tudo isso vai dando ao país uma nova feição.

Tínhamos, por primeira vez, um projeto de desenvolvimento nacional sendo colocado em prática pelo governo. E, como não poderia deixar de ser, isso teve reflexos diretos na área da cultura. Foram criadas importantes estruturas institucionais para tratar do tema: Serviço do Patrimônio Histórico Nacional (hoje IPHAN), Rádio Nacional, Instituto Nacional do Cinema Educativo, Serviço Nacional de Teatro, Instituto Nacional do Livro. O Maestro Villa-Lobos toma as escolas do país com o projeto de canto orfeônico. Ganham reconhecimento as Escolas de Samba e a Capoeira deixa de ser questão de polícia. O povo mais humilde, protagonista agora do desenvolvimento econômico, ganha também papel central na cultura. No terreno fértil do campo Nacional e Popular germinam as sementes que começaram a ser lançadas séculos antes, desde Gregório de Matos até Machado de Assis, passando pelos poetas inconfidentes, por Castro Alves, Martins Pena, Chiquinha Gonzaga, entre tantos outros. Na literatura, na música, no cinema, no teatro, o Brasil vive uma efervescência nunca vista e coloca-se entre os principais produtores de cultura do mundo. É desse momento que surgem as bases para a Bossa Nova, para o Cinema Novo, para o Teatro de Arena, para o CPC, para o MCP. Tudo isso foi alvo preferencial da brutalidade do golpe de 64. Não à toa o nunca inaugurado Teatro do CPC da UNE é incendiado já no primeiro dia do golpe.

Mas nem as chamas conseguiram extinguir o florescente movimento cultural brasileiro. Não temos medo de errar ao afirmar que tudo o que de mais significativo foi produzido pela cultura brasileira nas duas décadas seguintes – e talvez até hoje – ainda bebe daquela fonte. E isso é difícil de assimilar para uma parcela – cada vez menor, felizmente – da intelectualidade de nosso país. Refiro-me àqueles que acreditam que a esquerda, a história brasileira e nossa cultura começam no final dos anos 70. Que tudo o que veio antes foi arte popular sem povo, revolução das elites. O máximo que se permitem é lançar um olhar de soslaio à Semana de 22. Ainda assim mirando àquela parte dos modernistas que sonhavam em construir em São Paulo uma Paris tropical. Empanturram-se de torresmo e cachaça, mas insistem em fingir que arrotam foie gras e Dom Perignon! O problema é que, para eles, o povo só existe como conceito. E, infelizmente, as pessoas reais não se comportam como previsto nas suas teorias... Precisam, como Guarnieri, saber “Como é esse negócio de ser povo.[9]

Há ainda uma terceira hipótese, esta mais otimista. Uma parte significativa de nossa intelectualidade ainda está em estado de torpor com o momento que estamos vivendo no Brasil. Afinal, é difícil acreditar que vivemos em um país no qual o Presidente da República oferece cloroquina a emas! Que na maior epidemia de nossa história o Ministério da Saúde esteja acéfalo. Que durante mais de um ano o Ministério da Educação tenha sido ocupado por alguém que não saiba escrever direito. E que ele tenha sido substituído por um pastor que defenda surrar as crianças. Ou que o responsável pela cultura do país considere a hipótese de simplesmente extinguir a Cinemateca Brasileira.

Esquecer Guarnieri, porém, não é nem um pouco recomendável nesse caso. De saída vamos lembrar da canção Um Grito Parado No Ar: “Sei que há um céu sobre esta chuva / E um grito parado no ar”. Por mais aterrorizante que a chuva atual pareça, ela vai passar. E há um céu por cima. Isso não quer dizer, é claro, que devamos aguardar quietos e passivos o estio. É preciso não se desligar “desse povo que está aí”, juntar forças com todos aqueles que não aceitam, mergulhar o país no obscurantismo – inclusive com a parte de nossa intelectualidade que acabei de criticar. É preciso soltar o grito! É chegado o momento de construir uma ampla frente que junte todos aqueles – independentes de filiação partidária ou ideológica – que não aceitam ver o Brasil lançado nas trevas da ignorância e do autoritarismo. Talvez não seja tarefa fácil, mas é possível e necessária.

À guisa de exemplo, encerro com a narrativa feita por Juca de Oliveira[10] da fuga empreendida por ele e por Guarnieri em direção à Bolívia, logo depois do golpe de 64. Avisados por Dina Sfat que ambos, junto com Flávio Rangel, encabeçavam uma lista negra do DOPS, resolveram fugir do país. Levados no “potente fusca 59 de Cyro Del Nero, chegaram ao Mato Grosso, de onde tomaram – com um dinheirinho emprestado por Cyro – um trem para Corumbá. A intenção era cruzar para a Bolívia. Mas como cruzar a fronteira logo após o golpe? Seriam presos, com certeza. Guarnieri não se abalava. “Simples, vamos passar a nado”. Mas, completa Juca: “Isso foi antes de ver o rio. No que o Rio Paraguai assomou imenso e encapelado, ele se arrancou um incrível chumaço de cabelo e suspirou: “Mas é o mar!”.

A situação parecia desesperadora. Sem documentos, sem dinheiro, procurados pela repressão. Mas do medo vem a coragem. Munidos da cara de pau que só os grandes atores conseguem ter – e contando com muita sorte e com a displicência de um agente alfandegário – resolvem entrar na delegacia e solicitar um salvo-conduto para visitar a Bolívia. Mal tirando os olhos do gibi que o entretinha, o agente preencheu os documentos e os dois passaram a ponte e livraram-se da perseguição.

Mal pisando em território boliviano, Guarnieri grita: “Enganamos os filhos da puta! Estão pensando o que? Aqui o buraco é mais embaixo! Nos esperem! Vamos voltar e acabar com vocês!” O mar bolsonarista pode parecer intransponível para alguns. Mas não é. Conosco o buraco é mais embaixo. É só juntar todo mundo. Nós vamos acabar com eles!

 


[1] Roveri, Sérgio - Gianfrancesco Guarnieri/ Sérgio Roveri. – São Paulo: Imprensa Oficial do Estado de São Paulo: Cultura - Fundação Padre Anchieta, 2004. -- (Coleção aplauso. Série perfil / coordenador geral Rubens Ewald Filho), p.57;

[2] Op. Cit., p.39;

[3] Op. Cit., p.49;

[4] Op. Cit., p.56;

[5] Op. Cit., p.41;

[6] Op. Cit., p.42;

[7] Op. Cit., p. 5;

[8] Op. Cit., p. 168-169;

[9] Op. Cit., p. 56;

[10] Op. Cit., p. 171-182;

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