QUEREM BATER MINHA CARTEIRA
QUEREM BATER MINHA CARTEIRA
A estreia da comédia musical “Querem Bater Minha Carteira” marcou a inauguração do Teatro da UMES (atual Teatro Denoy de Oliveira), em setembro de 1994. Escrita pelo Grupo de Dramaturgia do CPC e tendo um elenco de estudantes, a peça teve a direção de Denoy de Oliveira, cenografia e figurinos de Luis Fernando e direção musical de Luis Carlos Bahia. O tema é a conquista da carteirinha de meio-passe e meia-entrada. “Querem Bater Minha Carteira” totalizou 120 apresentações.
CAMINHOS E PROPOSTAS
Nossa tentativa com “Querem Bater Minha Carteira” é realizar um teatro popular. Como tal entendemos um espetáculo feito com os códigos de domínio do grande público e sobre suas questões cotidianas fundamentais. Com o mesmo projeto, o CPC – Centro Popular de Cultura dos anos 60 procurava reeditar o teatro revista, a chanchada, o circo, com um humos espontâneo e debochado, que não fragilizava, ao contrário, potencializava as críticas ferozes contra os poderosos.
Também na “comedia dell’arte” o púbico medieval já conhecia perfeitamente aquelas máscaras e sabia de seus significados. Ele era vingado de sua exploração, quando o velho rico e babão era corneado pelo criado “duro” e a esposa ingênua, casada contra a vontade e por interesse de um pai ganancioso. O futuro sempre levava a melhor contra o já estabelecido. Da mesma forma, nos folguedos populares, mesmo quando o sistema autoritário inocula o conformismo em sua dramaturgia, cabe ao povo os significados de honra e dignidade, e o poder do dinheiro está sujeito a valores que igualem o direito de todos serem felizes.
Fincados no cotidiano dos estudantes, os personagens de “Querem Bater Minha Carteira” assumem declaradamente a metafísica do “clow”, sua síntese de significados críticos e de esperanças. O texto foi elaborado num trabalho coletivo pelo grupo de dramaturgia do CPC. Neste caso a proposta é uma peça aberta, que poderá sofrer transformações no correr de sua montagem. A cada situação nova, um novo pensamento. Os fatos cotidianos e seus desdobramentos terão prioridade na armação desse texto.
O tema escolhido – as carteirinhas meio-passe, meia-entrada- é específico do universo estudantil. Mas ele está ligado aos grandes problemas que afligem nossa atualidade; desde o aumento abusivo das mensalidades à privatização de nossas estatais. Com isso a peça reedita a figura do “Tio Sam”, injustamente esquecido nas críticas contra a dominação, quando a política do “big stick” continua a todo vapor, vide bloqueio de Cuba, a “guerrilha” na Nicarágua, as bombas no Iraque, a invasão do Haiti, tudo, claro, em nome da democracia e autodeterminação dos povos.
Embora algumas identidades, o Projeto CPC-UMES vai desenhando um perfil que o diferencia do CPC-UNE dos anos 60. Sua proposta é de ser um centro de experiências e informações, porque o mais correto é que existem no País vários CPC’s, funcionando em comunidades diversas, criando dramaturgia própria e a partir de seus problemas e necessidades específicos. E um grande passo para a “Produção Regional” que é a base para a democracia brasileira.
Ao mesmo tempo as novas tecnologias democratizam a criação. A técnica do vídeo não tem a complexidade do filme nem seus custos. E isso é básico para uma futura conquista: espaço da “Produção Independente” nos canais de TV.
Todos sabem que as antenas da Embratel foram montadas pela sociedade e usurpadas por meia dúzia de espertos que dominam de forma autoritária a informação e a sensibilidade. Então o Projeto CPC não é só dos estudantes, mas de toda a sociedade brasileira que precisa se libertar da manipulação do saber. É necessário que os artistas e intelectuais acordem da letargia do sucesso fácil, subordinado às regras de “marketing” e aprofundem seus sentimentos com os significados de um mundo mais justo, humano.
CPC – pode simbolizar uma revolução cultural que verdadeiramente expresse a esperança e a alegria de viver.
Mas este objetivo será conquistado no aprendizado e adestramento cotidianos, de forma plural como a sociedade, com todas as suas contradições e correntes de pensamento fluindo livremente, sem a imposição do poder e do capital.
(DENOY DE OLIVEIRA) São Paulo – setembro 1994
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