A autocrítica que o PT tem de realizar
Disse Lula, reunido com a direção do PT, que “o PT não tem que fazer autocrítica”. Foi além: “tem companheiro do PT que também fala que tem que fazer autocrítica. Eu não vou fazer o papel de oposição”.
É uma estranha concepção – ainda que bastante habitual, mesmo rotineira, em Lula. Como é óbvio que a “oposição” ao PT não pode fazer “autocrítica” pelo PT; e que, também é óbvio, se “autocrítica” é coisa dos inimigos do PT, só resta expulsar quem acha que é justo alguma autocrítica, estamos diante de uma negação completa de qualquer autocrítica.
Se Bolsonaro chegou ao poder, a culpa é dos outros, jamais de Lula, isto é, do PT.
Mas de que autocrítica estamos falando?
O texto abaixo, publicado originalmente no Portal Disparada, tem o mérito da clareza – e, também, o da concisão.
(C.L., do Jornal Hora do Povo)
ANDRÉ LUIZ DOS REIS
(Do Portal Disparada)
1) Os governos petistas mantiveram uma macroeconomia neoliberal. Deram uma pitada de neokeynesianismo, mas a arquitetura do tripé macroeconômico de Armínio Fraga foi mantida durante todo o período;
2) A macroeconomia neoliberal desindustrializou fortemente o país e nos tornou cada vez mais dependentes da exportação de comoddities. Os momentos de ”felicidade” do governo Lula se deveram, principalmente, à alta do barril de petróleo, da soja e do minério de ferro no mercado internacional. Não é à toa que o PT foi limado no ABC paulista;
3) A expansão de empregos durante a farra das comoddities se deu em áreas de baixa qualificação. Empregos em shoppings, em comércio de rua, em construção civil. A produtividade estagnou na era Lula e decresceu com Dilma. O pleno emprego em áreas de baixa qualificação não dá suporte a nenhuma economia saudável;
4) A Era PT consolidou o maior cartel de bancos da história brasileira, que se sentiu livre para impor os juros mais extorsivos do planeta, que chegam a quatrocentos por cento no cartão de crédito. A farra do crédito caro terminou com dezenas de milhões de famílias endividadas e com o nome no SPC, travando o consumo brasileiro pela próxima década, já que ninguém se propõe a resolver o problema.
5) Os programas sociais do PT se fundamentaram na propaganda do Bolsa-Família. O Bolsa-Família é a expressão de um programa neoliberal, criado por Milton Friedman;
6) O PT vendeu para as classes populares o mito da ”nova classe média” e da integração na cidadania via consumo. Foi um dos erros mais estúpidos que já se cometeu nesse país no diálogo com essas classes, consolidando nelas um ideal consumista típico de Miami sem que tivéssemos sequer a base produtiva real para sustentá-lo a longo prazo;
7) O PT não defendeu como deveria os direitos trabalhistas e previdenciários da população. Sempre que buscou um compromisso com as classes patronais, quem sofreu foram os trabalhadores. Esse tipo de compromisso culminou no erro de Dilma em 2015, logo depois das eleições, quando retirou direitos previdenciários e teve o ”estelionato eleitoral” denunciado pela CUT em protestos públicos;
8) Boa parte da crise fiscal do governo Dilma se deveu à implantação de um Bolsa empresário e de desonerações na folha de pagamento que lhe foram pedidas pela Fiesp;
9) O PT é não só conivente com a corrupção como se aproveitou estruturalmente dela para se manter no poder. Qualquer tentativa de tapar o sol com a peneira nisso daí é conversa pra boi dormir.
10) O PT não defendeu os preços que mais interessavam aos consumidores das grandes cidades. O custo de vida se tornou monstruoso, principalmente no âmbito da energia, do transporte público. Além disso, o PT consolidou o comércio da saúde, impulsionando a indústria dos planos de saúde;
11) O PT se abraçou obsessivamente com a promoção de uma agenda de costumes contrárias à sociedade conservadora e religiosa que diz representar. Confundiu projeto nacional com proselitismo de uma agenda radical de identitarismo pós-moderno.
12) O PT se aliou e incentivou politicamente a pior escória da sociedade brasileira: Eduardo Cunha, Cabral, Temer etc. no sistema partidário; Fiesp, cartel de bancos e agronegócio no sistema produtivo; pastores evangélicos como Silas Malafaia [governo Lula] e Edir Macedo como forma de dialogar com as classes populares urbanas. Deu no que deu.
E isso é só PRA COMEÇAR.
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