Quer intimidar juízes e procuradores. Senador Roberto Requião (PMDB-PR) será o relator do PL. “Queremos todos os ladrões na cadeia”, disse o senador paranaense
O presidente do Senado, Renan Calheiros, é o que se pode chamar uma torpeza pública e privada. O fato de alguém tão medíocre e sem compromisso com o país (exceto com o seu próprio bando) ocupar a presidência do Senado – onde já estiveram Feijó, Floriano, Nilo Peçanha, Nereu Ramos, Goulart – é, por si, uma vergonha nacional.
Mas não é só isso. É pior. As tentativas atuais de usar o cargo de presidente do Senado para acabar com a Operação Lava Jato – na qual é implicado em nove processos, mais três por outros ilícitos, inclusive um da Operação Zelotes, por venda de medidas provisórias às multinacionais automobilísticas – são próprias de um gangster, não de um parlamentar.
É óbvio que a República não pode conviver com essa falência moral. Um presidente do Senado com 12 processos por roubo da propriedade pública – mais um pedido de prisão por tentar mudar a lei para ficar impune, feito pelo Procurador Geral Rodrigo Janot – é algo inédito na História do Brasil.
Além de aberrações como o projeto de lei nº 3.636/2015 – de autoria de um correligionário e apadrinhado de Renan, Ricardo Ferraço (PSDB-ES) – que, na prática, anula as punições oriundas da Lava Jato, há o notório projeto de lei, supostamente, sobre o “abuso de autoridade”.
Este projeto foi exumado pelo tucano Gilmar Mendes, que, no STF, é o mais histérico representante da operação abafa contra a Lava Jato. Nem Renan nem Mendes acham que roubar é “abuso de autoridade”. Mas ambos acham que punir os ladrões é um terrível “abuso de autoridade”.
O texto, apresentado em 2009 pelo atual ministro da Defesa de Temer, Raul Jungman, fora engavetado pelas razões apontadas por Janot: “A proposta é muito ruim. Uma proposta não pode deixar de forma aberta tipos de abuso. Não pode criminalizar o que chamamos de crime de hermenêutica. Um juiz não pode ser criminalizado pelo fato de ter dado uma interpretação jurídica”.
ABUSO
Evidentemente, é possível discutir uma lei que coíba os abusos de autoridade – pois a atual é de 1965, portanto, foi instituída no primeiro governo da ditadura.
Coisa completamente diferente é, em meio às investigações da Operação Lava Jato, os próprios investigados, apenas para se proteger e proteger o seu roubo, substituírem a lei anterior por outra que define de maneira sofrível (ou, simplesmente, não define) o que constitui “abuso de autoridade”.
Por exemplo, pelo artigo 13 do projeto de lei, é crime, passível de condenação a quatro anos de cadeia, “constranger alguém, sob ameaça de prisão, a depor sobre fatos que possam incriminá-lo”.
O que isso quer dizer é que, na prática, ficam proibidas as “delações premiadas”. Se nem a ameaça de prisão pode ser utilizada, muito menos a prisão, quando esta for cabível.
Na página oito desta edição, publicamos artigo do juiz Sérgio Moro em que há algumas precisas observações sobre este problema: nenhum ladrão do dinheiro público vai confessar, se não estiver ameaçado de prisão – ou preso, evidentemente por razões que a lei determine a sua prisão. Por sua natureza, não existe punição aos “crimes de colarinho branco”, sem que haja confissão ou confissões.
Além disso, existe, como disse Janot, uma série de questões que são interpretativas (ou seja, “hermenêuticas”, como dizem os juristas). Por exemplo, o projeto de lei prevê condenação de até cinco anos de cadeia (mais multa) para quem “dar início ou proceder à persecução penal, civil ou administrativa, sem justa causa fundamentada” ( Art. 30).
Será que qualquer absolvição é prova de que não existia “justa causa fundamentada” para abrir o processo? Seria um absurdo, mas, do jeito que está no projeto, seria fácil chegar a essa conclusão absurda.
Evidentemente, discussões jurídicas à parte, Renan somente se agarrou a esse projeto, exumado por Gilmar Mendes, porque quer acabar com a Lava Jato antes que a Lava Jato acabe com ele.
Portanto, a própria apresentação do projeto neste momento é uma indecência. Pior ainda quando se tentou aprová-lo de afogadilho, sem discussão – e Renan tentou esse golpe (sim, golpe) várias vezes, e fracassou em todas. Até o seu colega Romero Jucá (PMDB-RR), também implicado na Lava Jato, não se atreveu a levá-lo avante (Jucá, por sinal, acaba de ser nomeado, por Temer, líder do governo – esse, como o anterior, é um governo de investigados pela Lava Jato).
Mas Renan não desistiu – até porque os processos correm lentamente, no STF, mas correm. E vem aí a delação dos 70 da Odebrecht. Esta, é, aliás, o motivo da atual pressa e desespero para tornar imunes, impunes – acima das leis atuais – os propineiros que a Operação Lava Jato está cercando.
REQUIÃO
Com a ida de Romero Jucá para a liderança do governo, Renan convidou o senador Roberto Requião para relator do projeto. Renan quer cobrir o projeto com uma autoridade e legitimidade que não tem. Torrado moralmente, Renan quer usar Requião para passar o projeto.
No entanto, Requião tem uma posição firmada sobre a Lava Jato, que é oposta a de Renan, do PT, etc. No último dia quatro, Requião afirmou que “o clima nacional de combate à corrupção é muito bom. Queremos todos os ladrões na cadeia”. E propugnou pela continuidade da Lava Jato: “Quero ver as delações do Marcelo Odebrecht e do Eduardo Cunha, a Lava Jato não pode ser seletiva, todos os ladrões do dinheiro público, indistintamente, devem ir para a cadeia”.
Ao aceitar a relatoria do projeto, Requião afirmou que “querem se considerar acima da sociedade e da lei. Isso tem que acabar e acabar de uma forma racional e equilibrada”.
É verdade. O esquema corrupto que tomou o país se considera tão acima da lei que até quer mudar as leis de acordo com suas corruptas conveniências.
Renan era – sobretudo depois que o PT lhe concedeu, durante 11 anos, a frota de petroleiros da Petrobrás (a Transpetro, onde alojou um preposto, o ex-senador tucano e peemedebista Sérgio Machado) – um chefe de quadrilha bem-sucedido.
As gravações de Renan feitas por Machado, onde, inclusive, fala-se de um “acordão” para acabar com a Lava Jato (com a ênfase de Renan em proibir “delações premiadas” de investigados sob prisão preventiva – o que está no projeto sobre suposto “abuso de autoridade), acabou com esse sucesso.
Porém, não foi só na confissão de Machado que as propinas para Renan apareceram:
O ex-diretor de Abastecimento da Petrobrás, Paulo Roberto Costa, afirmou em seu depoimento que as propinas para Renan fizeram estourar o “teto” de 3% “normalmente” destinados a políticos.
Em junho deste ano, quando o STF permitiu a publicação dos depoimentos de Nestor Cerveró, ex-diretor internacional da Petrobrás, soube-se que, em 2012, esse funcionário foi chamado por Renan em seu gabinete, para reclamar da “falta de propina”.
Em abril também deste ano, a relatora da Operação Zelotes, ministra Cármen Lúcia, do STF, já abrira inquérito para investigar a participação de Calheiros (e Jucá) na venda de emendas a medidas provisórias para o setor automotivo.
Na quarta-feira, Moro decretou a prisão do ex-governador Sérgio Cabral, o que causou um clima de festa no Rio de Janeiro.
Fonte: Carlos Lopes da Hora do Povo
Renan quer armar uma lei para escapar da Lava Jato
Quer intimidar juízes e procuradores. Senador Roberto Requião (PMDB-PR) será o relator do PL. “Queremos todos os ladrões na cadeia”, disse o senador paranaense
O presidente do Senado, Renan Calheiros, é o que se pode chamar uma torpeza pública e privada. O fato de alguém tão medíocre e sem compromisso com o país (exceto com o seu próprio bando) ocupar a presidência do Senado – onde já estiveram Feijó, Floriano, Nilo Peçanha, Nereu Ramos, Goulart – é, por si, uma vergonha nacional.
Mas não é só isso. É pior. As tentativas atuais de usar o cargo de presidente do Senado para acabar com a Operação Lava Jato – na qual é implicado em nove processos, mais três por outros ilícitos, inclusive um da Operação Zelotes, por venda de medidas provisórias às multinacionais automobilísticas – são próprias de um gangster, não de um parlamentar.
É óbvio que a República não pode conviver com essa falência moral. Um presidente do Senado com 12 processos por roubo da propriedade pública – mais um pedido de prisão por tentar mudar a lei para ficar impune, feito pelo Procurador Geral Rodrigo Janot – é algo inédito na História do Brasil.
Além de aberrações como o projeto de lei nº 3.636/2015 – de autoria de um correligionário e apadrinhado de Renan, Ricardo Ferraço (PSDB-ES) – que, na prática, anula as punições oriundas da Lava Jato, há o notório projeto de lei, supostamente, sobre o “abuso de autoridade”.
Este projeto foi exumado pelo tucano Gilmar Mendes, que, no STF, é o mais histérico representante da operação abafa contra a Lava Jato. Nem Renan nem Mendes acham que roubar é “abuso de autoridade”. Mas ambos acham que punir os ladrões é um terrível “abuso de autoridade”.
O texto, apresentado em 2009 pelo atual ministro da Defesa de Temer, Raul Jungman, fora engavetado pelas razões apontadas por Janot: “A proposta é muito ruim. Uma proposta não pode deixar de forma aberta tipos de abuso. Não pode criminalizar o que chamamos de crime de hermenêutica. Um juiz não pode ser criminalizado pelo fato de ter dado uma interpretação jurídica”.
ABUSO
Evidentemente, é possível discutir uma lei que coíba os abusos de autoridade – pois a atual é de 1965, portanto, foi instituída no primeiro governo da ditadura.
Coisa completamente diferente é, em meio às investigações da Operação Lava Jato, os próprios investigados, apenas para se proteger e proteger o seu roubo, substituírem a lei anterior por outra que define de maneira sofrível (ou, simplesmente, não define) o que constitui “abuso de autoridade”.
Por exemplo, pelo artigo 13 do projeto de lei, é crime, passível de condenação a quatro anos de cadeia, “constranger alguém, sob ameaça de prisão, a depor sobre fatos que possam incriminá-lo”.
O que isso quer dizer é que, na prática, ficam proibidas as “delações premiadas”. Se nem a ameaça de prisão pode ser utilizada, muito menos a prisão, quando esta for cabível.
Na página oito desta edição, publicamos artigo do juiz Sérgio Moro em que há algumas precisas observações sobre este problema: nenhum ladrão do dinheiro público vai confessar, se não estiver ameaçado de prisão – ou preso, evidentemente por razões que a lei determine a sua prisão. Por sua natureza, não existe punição aos “crimes de colarinho branco”, sem que haja confissão ou confissões.
Além disso, existe, como disse Janot, uma série de questões que são interpretativas (ou seja, “hermenêuticas”, como dizem os juristas). Por exemplo, o projeto de lei prevê condenação de até cinco anos de cadeia (mais multa) para quem “dar início ou proceder à persecução penal, civil ou administrativa, sem justa causa fundamentada” ( Art. 30).
Será que qualquer absolvição é prova de que não existia “justa causa fundamentada” para abrir o processo? Seria um absurdo, mas, do jeito que está no projeto, seria fácil chegar a essa conclusão absurda.
Evidentemente, discussões jurídicas à parte, Renan somente se agarrou a esse projeto, exumado por Gilmar Mendes, porque quer acabar com a Lava Jato antes que a Lava Jato acabe com ele.
Portanto, a própria apresentação do projeto neste momento é uma indecência. Pior ainda quando se tentou aprová-lo de afogadilho, sem discussão – e Renan tentou esse golpe (sim, golpe) várias vezes, e fracassou em todas. Até o seu colega Romero Jucá (PMDB-RR), também implicado na Lava Jato, não se atreveu a levá-lo avante (Jucá, por sinal, acaba de ser nomeado, por Temer, líder do governo – esse, como o anterior, é um governo de investigados pela Lava Jato).
Mas Renan não desistiu – até porque os processos correm lentamente, no STF, mas correm. E vem aí a delação dos 70 da Odebrecht. Esta, é, aliás, o motivo da atual pressa e desespero para tornar imunes, impunes – acima das leis atuais – os propineiros que a Operação Lava Jato está cercando.
REQUIÃO
Com a ida de Romero Jucá para a liderança do governo, Renan convidou o senador Roberto Requião para relator do projeto. Renan quer cobrir o projeto com uma autoridade e legitimidade que não tem. Torrado moralmente, Renan quer usar Requião para passar o projeto.
No entanto, Requião tem uma posição firmada sobre a Lava Jato, que é oposta a de Renan, do PT, etc. No último dia quatro, Requião afirmou que “o clima nacional de combate à corrupção é muito bom. Queremos todos os ladrões na cadeia”. E propugnou pela continuidade da Lava Jato: “Quero ver as delações do Marcelo Odebrecht e do Eduardo Cunha, a Lava Jato não pode ser seletiva, todos os ladrões do dinheiro público, indistintamente, devem ir para a cadeia”.
Ao aceitar a relatoria do projeto, Requião afirmou que “querem se considerar acima da sociedade e da lei. Isso tem que acabar e acabar de uma forma racional e equilibrada”.
É verdade. O esquema corrupto que tomou o país se considera tão acima da lei que até quer mudar as leis de acordo com suas corruptas conveniências.
Renan era – sobretudo depois que o PT lhe concedeu, durante 11 anos, a frota de petroleiros da Petrobrás (a Transpetro, onde alojou um preposto, o ex-senador tucano e peemedebista Sérgio Machado) – um chefe de quadrilha bem-sucedido.
As gravações de Renan feitas por Machado, onde, inclusive, fala-se de um “acordão” para acabar com a Lava Jato (com a ênfase de Renan em proibir “delações premiadas” de investigados sob prisão preventiva – o que está no projeto sobre suposto “abuso de autoridade), acabou com esse sucesso.
Porém, não foi só na confissão de Machado que as propinas para Renan apareceram:
O ex-diretor de Abastecimento da Petrobrás, Paulo Roberto Costa, afirmou em seu depoimento que as propinas para Renan fizeram estourar o “teto” de 3% “normalmente” destinados a políticos.
Em junho deste ano, quando o STF permitiu a publicação dos depoimentos de Nestor Cerveró, ex-diretor internacional da Petrobrás, soube-se que, em 2012, esse funcionário foi chamado por Renan em seu gabinete, para reclamar da “falta de propina”.
Em abril também deste ano, a relatora da Operação Zelotes, ministra Cármen Lúcia, do STF, já abrira inquérito para investigar a participação de Calheiros (e Jucá) na venda de emendas a medidas provisórias para o setor automotivo.
Na quarta-feira, Moro decretou a prisão do ex-governador Sérgio Cabral, o que causou um clima de festa no Rio de Janeiro.
Fonte: Carlos Lopes da Hora do Povo