Governo Temer nega ajuda a estados em situação de calamidade pública
Desonerações provocaram uma queda de R$ 14 bilhões no Fundo de Participação dos Estados (FPE). Governadores pedem R$ 7 bi para emergências
Governadores de 17 estados se reuniram na última terça-feira com o ministro da Fazenda do governo Temer, Henrique Meirelles, para cobrar um posicionamento sobre a renegociação das dívidas estaduais e pedir um socorro financeiro emergencial de R$ 7 bilhões. A queda no Fundo de Participação dos Estados (FPE) os deixou à míngua – e ao menos 14 Estados devem decretar estado de calamidade pública na próxima semana.
O FPE é composto por uma parcela da arrecadação do Imposto sobre Produtos Industrializados (IPI) e uma parcela do Imposto de Renda (IR). As isenções de IPI – as “desonerações” – do governo Dilma rebaixaram os recursos dos Estados. Depois, a recessão, que baixou a arrecadação tanto do IPI quanto do IR – e também do imposto estadual, o ICMS – acabaram por quebrar os Estados. Em julho, por exemplo, Sergipe teve uma queda real de -30% no FPE, a do Ceará foi -20,4% e a de Alagoas, -25%, em relação ao mês anterior, numa situação em que esse Fundo, e também o ICMS, estão caindo desde janeiro de 2015.
Na reunião com Meirelles, os governadores argumentaram que o governo federal foi o grande responsável pela queda de arrecadação, que, aliada à falta de renegociação da dívida, gerou tamanha crise. No início de julho, os Estados pediram um socorro de R$ 14 bilhões ao Ministério da Fazenda, mas concordaram em reduzir para R$ 7 bilhões o pedido.
Meirelles respondeu que o importante para o governo é dar segurança ao mercado. Como sempre, o “mercado” de Meirelles não inclui as pessoas e as empresas nacionais, ou seja, o Brasil. Somente banqueiros – e outros quadrilheiros do mercado financeiro.
No momento, segundo disse, a prioridade do governo é aprovar a Proposta de Emenda Constitucional nº 241 (PEC 241), que proíbe o aumento de gastos do governo no atendimento ao povo pelos próximos 20 anos. Assim, Saúde, Educação e todos os gastos com o povo não poderiam aumentar – pelo contrário, diminuiriam – enquanto o desvio de verba para os gastos com juros continuaria à solta e em aumento.
Assim, segundo o parecer de Temer & Meirelles, os governadores e o povo que se danem. Depois da reunião, em nota oficial, disse Meirelles que “o descontrole do crescimento da dívida pública é a causa da atual situação fiscal dos Estados” – o que é, literalmente, mentira. Com exceção de Alagoas, nenhum Estado do Nordeste, por exemplo, teve crescimento da dívida – eles estão quebrados porque a política do governo federal jogou a arrecadação (FPE e ICMS) em um abismo.
Mesmo nos Estados em que a dívida é asfixiante – São Paulo, Rio de Janeiro, Rio Grande do Sul, Minas Gerais, Goiás e Alagoas – isto se deve à renegociação de Fernando Henrique, em 1997 e 1998, e sua manutenção por Lula e Dilma.
Por exemplo: a dívida do Estado de São Paulo, em 1997, era R$ 50,38 bilhões. Com a renegociação de Fernando Henrique, o Estado pagou, até março deste ano, R$ 131,35 bilhões – e sua dívida aumentou para R$ 225,90 bilhões (dados do BC e do Governo de São Paulo), sem que houvesse nenhuma dívida nova.
Após a reunião com Meirelles, o governador da Paraíba, Ricardo Coutinho, declarou que “estamos pagando por um processo que não é estadual, é da União. O que nós queremos é um fôlego para não desorganizar os serviços. Você imagina o que é hospital, segurança, os serviços públicos mais essenciais, sem capacidade de ter continuidade? Esse diálogo não está avançando e eu acho muito ruim porque você pode ter 14 estados que tenham de decretar calamidade. É preciso tirar essa ideia que o tal do fiscal está acima da vida ou da morte”.
Jackson Barreto, governador de Sergipe, afirmou estar pagando a folha de julho. “A hora que a gente tiver 14, 15 estados decretando estado de calamidade, qual é a consequência? Um ambiente muito ruim para o país”, destacou Wellington Dias, governador do Piauí. Os governadores queriam informar pessoalmente a Temer sobre a decisão de decretar situação de calamidade pública, mas ele não os recebeu.
Na reunião, os governadores lembraram que o líder do governo na Câmara, André Moura, afirmou, em 10 de agosto, que o governo estudava propostas para atendê-los. Meirelles disse desconhecer a promessa, causando irritação nos governadores – que mostraram a ele o vídeo com a declaração de Moura, feita no plenário da Câmara.
O governador de Mato Grosso, Pedro Taques, afirmou que falta até mesmo dinheiro para o salário de policiais e gasolina para viaturas. “Esta reunião é uma consequência da falta de resposta de outras reuniões, da falta total de resposta ao que foi combinado. Isso tem que ser dito. Houve uma reunião há 23 dias, quando nos pediram 15 dias para buscar solução – e já se passaram 23 dias. Não estamos preocupados em fechar a conta do ano, estamos preocupados em fechar as contas do mês”.
O ministro da Fazenda disse, em sua nota, que levará os pedidos a Temer para “discutir alternativas”. Mas a secretária do Tesouro, Ana Paula Vescovi, declarou que o governo não vai abrir negociação com os Estados. Segundo ela, “a renegociação já foi feita”. E disse que, mesmo que os governos estaduais decretem calamidade, não ficariam desobrigados de pagar as dívidas – e que o governo federal não tem a obrigação de socorrê-los.
Participaram da reunião com Meirelles os governadores do Distrito Federal e dos estados da Bahia, Rio de Janeiro, Pernambuco, Goiás, Mato Grosso, Ceará, Paraíba, Piauí, Rio Grande do Norte, Sergipe, Amazonas, Paraná, Acre, Amapá, Roraima e Tocantins. Dos estados que participaram, apenas Ceará e Maranhão disseram que não irão decretar calamidade pública.
DINHEIRO
Ao mesmo tempo que o governo afirma não ter como ajudar os Estados com R$ 7 bilhões, anunciou que vai gastar R$ 32 bilhões em seu programa de privatizações, para entregar aeroportos, rodovias, ferrovias, portos e projetos do setor elétrico (v. matéria na página 2). O FI-FGTS, fundo dos trabalhadores, será usado agora, segundo a MP 727 de Temer, para financiar a privatização de áreas estratégicas. No governo Dilma, ele foi usado para favorecer empresas investigadas pela Operação Lava Jato, em especial a Sete Brasil e as subsidiárias da Odebrecht.
Temer não fala em corte de juros – só em corte de verbas, investimentos e direitos trabalhistas. Sob a forma de juros, no ano passado, foram transferidos para bancos, fundos, e outros rentistas, R$ 502 bilhões. Este ano, de janeiro a julho, o setor público já repassou, a título de juros, aos bancos, fundos e outros parasitas, R$ 213 bilhões e 899 milhões.
Mas Temer não tem de onde tirar R$ 7 bilhões para pagar médicos, professores e policiais…
Fonte: Camila Severo da Hora do Povo