Denúncia contra o jornalista Glenn Greenwald fere a liberdade de imprensa
Jornalista foi acusado por suposto crime de interceptação de diálogos privados
No dia 21 de janeiro, o procurador Wellington Divino Marques de Oliveira, do Ministério Público Federal (MPF) do Distrito Federal denunciou o jornalista Glenn Greenwald, por supostos crimes relacionados à interceptação de diálogos privados envolvendo o então juiz Sergio Moro, Deltan Dallagnol e procuradores da Operação Lava Jato.
Os diálogos foram divulgados pelo Intercept Brasil, de Greenwald, e os parceiros Folha, Uol e El País, em cobertura que passou a ser conhecida como “Vaza Jato”.
A inclusão do nome do jornalista na denúncia representa um inaceitável ataque à liberdade de imprensa que é respaldada pela nossa Constituição. Além disso, demonstra um total desrespeito à democracia, ao tratar um jornalista que agiu dentro do respaldo legal como criminoso.
O promotor Wellington Divino Marques de Oliveira desrespeita um dos preceitos fundamentais do nosso país. Anteriormente ele já havia tentado acusar o presidente da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB), Felipe Santa Cruz, por um suposto crime de calúnia contra o ministro da Justiça, Sérgio Moro. A denúncia contra Santa Cruz foi rejeitada pela Justiça posteriormente.
Como destacou a Federação Nacional dos Jornalistas (Fenaj) o promotor “ignora a Constituição Brasileira, que assegura a liberdade de imprensa. Ignora também decisão de 2019 do Supremo Tribunal Federal (STF) que determinou que o jornalista não fosse investigado no âmbito da Operação Spoofing, da Polícia Federal, destinada a investigar invasões de celulares de autoridades”.
DENÚNCIA ABSURDA
Por todo o país, lideranças políticas, entidades e juristas repudiaram o ataque à liberdade de imprensa.
Para a Associação Brasileira de Imprensa (ABI), “a acusação é um atentado à Constituição, um desrespeito ao Supremo Tribunal Federal (STF) e à Polícia Federal, bem como uma tentativa de condenar o jornalista. A entidade ainda “conclama a Justiça Federal a rejeitar a denúncia”.
“A Associação Brasileira de Imprensa (ABI) manifesta sua irrestrita solidariedade ao jornalista Glenn Greenwald, diante da denúncia absurda apresentada à Justiça por um procurador do Ministério Público Federal (MPF)”, diz a nota.
A Ordem dos Advogados do Brasil (OAB) afirmou, por meio de nota, que a denúncia apresentada na terça-feira (21) não descreve a prática de crime. Para a OAB, “a acusação representa um risco para a liberdade de imprensa, e não descreve ilegalidades”.
A Associação Brasileira de Jornalismo Investigativo (Abraji) divulgou nota em que considera nula a denúncia contra o jornalista Glenn Greenwald. Na nota, a associação diz que, ao investigar o caso, a Polícia Federal não encontrou indícios de que Greenwald tivesse envolvimento nos crimes. “A conclusão está em relatório da PF de dezembro de 2019”, diz a nota.
A Abraji afirma que os diálogos apresentados como provas não confirmam as acusações do promotor.
O presidente da Câmara, Rodrigo Maia (DEM), manifestou-se sobre o caso pelo Twitter e destacou que a imprensa livre é essencial para a democracia, “A denúncia contra o jornalista Glenn Greenwald é uma ameaça à liberdade de imprensa. Jornalismo não é crime. Sem jornalismo livre não há democracia”, disse.
O ex-ministro e ex-governador do Ceará, Ciro Gomes (PDT), considerou estapafúrdia a decisão do MPF e reforçou a importância do jornalismo para garantir a democracia. “Sem pé nem cabeça esta denúncia contra o jornalista Glenn Greenwald. O jornalismo é tarefa essencial à democracia e às liberdades individuais e públicas. O que Glenn fez foi o mais genuíno jornalismo”, defendeu.
O governador do Maranhão, Flávio Dino (PCdoB), afirmou que a denúncia é “mais um terraplanismo jurídico”. “Muito difícil sustentar juridicamente uma ação penal contra direitos constitucionais atinentes ao sigilo de fonte no jornalismo e contra uma liminar do Supremo. Parece mais um terraplanismo jurídico, que está em moda nesses tempos de trevas”, escreveu o governador no Twitter.
Os ministros do Supremo Tribunal Federal (STF) Gilmar Mendes e Marco Aurélio Mello manifestaram discordância com a decisão do procurador do DF. Mendes classificou a denúncia como “um ato que visa à responsabilização do fundador do site The Intercept Brasil”. O ministro Marco Aurélio Mello disse que a denúncia é perigosa. “Toda iniciativa que fustigue jornalista, que fustigue veículo de comunicação, tem que ser pensada muito antes de implementada. É o caso da denúncia, julgamento. Tem que sopesar, analisar valores e decidir qual é o valor que deve prevalecer”, diz.
A deputada Jandira Feghali (PCdoB-RJ), líder da Minoria na Câmara Federal, considerou a medida como uma “caçada ao jornalista”. “O Procurador do MPF ignorou relatório da Polícia Federal que descartava Greenwald como cúmplice das ações de hacker”, disse.
O partido Rede, do senador Randolfe Rodrigues (AP) e Marina Silva, havia entrado com uma representação junto ao Supremo Tribunal Federal (STF) e conseguido do órgão a decisão de proibir qualquer investigação do jornalista. A Polícia Federal também havia concluído que o jornalista não cometeu nenhum crime e não o indiciou no inquérito sobre o caso.