Na noite da sexta-feira (23), a Assembleia Legislativa de São Paulo (ALESP) prestou homenagem ao Professor Eduardo de Oliveira, líder do movimento negro e da luta pela libertação nacional, que completaria 93 anos neste mês de agosto. O evento “Legado da Resistência Pela Liberdade do Negro e do Brasil – Homenagem Especial ao Professor Eduardo de Oliveira”, foi uma iniciativa da deputada estadual Leci Brandão (PCdoB-SP).
Dirigentes da UMES participaram da homenagem ao Professor Eduardo, um grande brasileiro que sempre se fez presente nas lutas dos estudantes e da juventude brasileira.
Dezenas de lideranças dos movimentos negro, estudantil, de moradia e de mulheres lotaram o auditório Teotônio Vilela, da Assembleia, para prestar homenagem ao Professor Eduardo, primeiro vereador negro da Câmara Municipal de São Paulo, fundador do Congresso Nacional Afro-Brasileiro (CNAB) e autor do “Hino à Negritude”, oficializado como um dos hinos da Nação pela Lei Federal nº 12.981, de 28 de maio de 2014.
Após a execução do Hino Nacional e do Hino à Negritude, a deputada Leci Brandão deu início à solenidade, destacando a importância de Eduardo de Oliveira na luta pela igualdade racial e pelo desenvolvimento nacional. “Uma pessoa carinhosa e sábia”, como qualificou a deputada.
A deputada também manifestou “gratidão profunda aos que mandaram mensagens de condolências pelo falecimento de minha mãe, Leci de Assumpção Brandão”.
“Hoje eu sei o que é a dor do sofrimento, a dor da saudade. Não é tristeza, é saudade de uma pessoa que fez que chegasse onde cheguei. A maior amiga que eu tive. Uma mulher negra, guerreira, trabalhadora humilde, mas que com sua dignidade, conseguiu construir a sua história”, disse Leci.
Sobre a trajetória do Professor Eduardo, Leci destacou:
“É muito difícil relembrar de um homem que sempre me tratou com muito carinho, que sempre incentivou o meu trabalho. Quando cheguei no conselho da Sepir [Secretaria Especial da Promoção da Igualdade Racial], comandado pela ministra Mathilde Ribeiro, o Professor Eduardo dizia que eu deveria seguir outro caminho, não ficar só no conselho, fazer outras coisas… Acho que ele estava fazendo uma profecia. Eu não podia imaginar naquela época, que estaria aqui nesta Casa, como a segunda mulher negra a entrar nessa Assembleia”.
Segundo Leci, o “Professor Eduardo era uma pessoa extremamente carinhosa, um homem que tratava a todos com muito respeito, dentro de uma simplicidade única. Um homem sábio”.
RETROCESSOS
Leci também criticou a situação atual do nosso país e os retrocessos no governo Bolsonaro. “Nós estamos passando por um processo de retrocesso muito grande, estamos passando por muita dificuldade no nosso país”.
“Quando o Professor Eduardo dizia que o Brasil só será libertado no dia em que todos os negros se libertarem, ele falou algo extremamente importante”.
“Temos que colocar uma coisa na nossa cabeça. Enquanto nós, negros e negras, não ocuparmos os poderes deste país, de forma legítima e merecedora, as coisas continuarão difíceis para nós. Não adianta ficarmos apenas reafirmando que somos mais da metade da população deste país, se nós não estamos no poder deste país”.
A deputada também criticou o descaso do governo Bolsonaro e o desrespeito ao meio ambiente. “Uma pena vermos a Amazônia pegando fogo e o que ouvimos são absurdos, só sandices… Estamos ouvindo gente louca ocupando o poder enquanto nosso país está se despedaçando, indo para o fundo do poço”.
“Tem gente que diz para mim, ‘mas eles foram eleitos e a eleição foi legítima, aguentem!’. Só que eu não sou responsável por essa situação e a maioria de nós também não é, mas nós temos que fazer alguma coisa!”, ressaltou a deputada.
Leci também afirmou estar muito “esperançosa com a juventude, que luta no dia-a-dia nas comunidades. Principalmente das mulheres negras”. E destacou que a luta acontece, apesar dos feminicídios e genocídio pela qual a juventude passa. As mulheres têm na sua cabeça que vão conseguir transpor esses obstáculos”.
Por fim, Leci também comemorou a aprovação do projeto de lei 226/2017, que pune administrativamente a prática de atos discriminatórios por motivos religiosos.
“Nós estamos defendendo apenas as religiões de matrizes africanas. Estamos defendendo e blindando contra qualquer preconceito que haja contra qualquer religião. Muitos deputados parecem que não entenderam isso. É claro que as religiões de matrizes africanas são as mais perseguidas, mas defendemos todas as religiões. Felizmente avançamos nesta luta”, disse.
ORLANDO
O deputado federal Orlando Silva (PCdoB-SP) também fez sua saudação no evento. Orlando destacou que teve a oportunidade de realizar uma singela homenagem ao Professor Eduardo de Oliveira durante sessão na Câmara dos Deputados no último dia 6 de agosto, data em que o poeta completaria 93 anos.
“Foi uma forma de registrar a data do aniversário do Professor Eduardo, que tive a honra de conhecer quando vim morar em São Paulo, há quase 30 anos. Encontrava o Professor Eduardo nas marchas e debates, em atividades que o movimento negro produzia e em debates”.
“Sempre com um sorriso, paciente… Um sujeito que ouvia todo mundo. Até eu, moleque que falava qualquer coisa e ele prestava atenção. Sempre tentando compreender o que as pessoas falavam e transmitir os seus conhecimentos”.
“É muito importante que um homem lute a vida inteira e o Professor Eduardo é o símbolo daqueles que lutam a vida inteira. Um velho camarada, o João Amazonas, dizia que ‘viver é lutar’ e o Eduardo é o símbolo desta luta”, continuou o deputado.
“Um homem que tem na sua trajetória a marca da luta pelos direitos do povo negro, mas também a marca da luta pela democracia e pela soberania nacional”, destacou o parlamentar.
Orlando ainda ressaltou a luta contra o chamado “Pacote Anticrime”, apresentado pelo governo no Congresso. “Que talvez seja um dos desafios do povo negro brasileiro”. “Um conjunto de medidas que altera o Código Penal e que, na prática, vai oferecer mais instrumentos para a violência do Estado contra o povo pobre”.
ALFREDO
O presidente do Congresso Nacional Afro-Brasileiro, Alfredo Oliveira, agradeceu à deputada Leci Brandão e a todos os presentes pela homenagem concedida ao fundador do CNAB.
Alfredo apresentou uma breve biografia da vida do professor, destacando suas principais criações que vão desde a composição do Hino à Negritude, aos 16 anos, aos seus livros de poemas, como “Banzo” e “Gestas Líricas da Negritude”; e “Quem é Quem na Negritude Brasileira”, que traça o perfil de mais de 500 lideranças negras do país.
O presidente do CNAB destacou ainda importantes episódios da vida de Eduardo de Oliveira, como a eleição à Câmara dos Vereadores de São Paulo, a atuação na luta pelo “Petróleo É Nosso”, a troca de correspondências com o líder negro norte-americano Martin Luther King, sua atuação nas lutas democráticas do país e a recepção a Nelson Mandela, na década de 90.
“Eduardo indignava-se ao ver os recursos de nosso país se esvaindo para os cofres dos banqueiros e agiotas internacionais”, destacou.
“Eduardo de Oliveira nos deixa um legado glorioso e uma missão: a luta por uma nação livre e soberana continua e passa pela liberdade de mulheres e homens. Coragem e disposição de luta jamais faltaram aos nossos bravos brasileiros”, destacou. “Certamente estaria na linha de frente na batalha contra os retrocessos do governo Bolsonaro”, completou Alfredo.
Claudio Souza, coordenador do SOS Racismo, da Assembleia Legislativa de São Paulo, relembrou que a sala do SOS Racismo da Alesp foi batizada com o nome de Eduardo de Oliveira, e que os funcionários da Assembleia estão demandando à mesa diretora da Casa a nomeação oficial da sala com o nome do líder negro.
Ivan Lima, presidente do Conselho de Participação da Comunidade Negra de São Paulo, destacou a experiência de vida junto ao Professor e relembrou o início de sua trajetória política, em Pirituba, onde Eduardo de Oliveira atuava na construção da candidatura de Lídia Correa para vereadora. “É uma enorme satisfação estar aqui enaltecendo a figura deste grande líder. Nós do conselho já temos feito esta iniciativa de executar o Hino à Negritude em nossas atividades”.
BIRA
O presidente da Central Geral dos Trabalhadores do Brasil (CGTB), Ubiraci Dantas, afirmou que o Professor Eduardo sempre esteve à frente de todas as lutas e atos contra o racismo e em defesa do Brasil. Um homem que não teve dúvidas de ir ao Congresso Nacional e peitar todos os que iam contra a aprovação do Hino à Negritude, um homem simples, humilde, paciente e que não deixava nenhuma injustiça passar batida.
O sindicalista destacou que Eduardo de Oliveira estaria firme na luta contra a reforma da Previdência de Bolsonaro, que saqueia os mais pobres e tira o adicional de insalubridade das profissões de risco.
“Mas pintou uma luz no fim do túnel”, disse Bira, ao destacar que o Senado retirou do texto da MP 881, a liberação do trabalho aos domingos e feriados. “Isso abre espaço para derrotarmos essa PEC da morte e da escravidão”, destacou.
JOSÉ FRANCISCO
José Francisco de Oliveira, filho do Professor, relembrou que como vereador, Eduardo foi autor de uma lei que impedia a entrada dos vereadores com armas na Câmara. Ele sempre foi contra a violência.
“Certa feita estava em Lavras, terminando meu doutorado, e fui participar de um grupo de jovens negros e a professora que coordenava esse grupo me disse que conhecia meu pai, disse que o conhecia da cidade de São Carlos. Foi aí que entendi porque eu via pouco ele. Porque a família dele era muito maior. Hoje eu conheço as pessoas por conta do meu pai”, frisou.
“Então o professor me ensinou essa grandeza, essa coisa maior. Que a coisa tem que ser coletiva, tem que ser para todos”.
“Estamos num momento muito delicado da luta. Porque aquele racista que estava oculto, agora vai para rua e diz que não gosta de negros, que é contra as cotas. Temos que defender as cotas, elas são uma conquista do movimento negro”, enfatizou José Francisco.
Do Jornal Hora do Povo
José Francisco enfatizou a necessidade de ampliar a divulgação do Hino à Negritude, “levar esse hino às nossas crianças”. “O nosso hino é o Hino à Negritude, temos que levar isso para nossas escolas. É um compromisso com o professor, é um compromisso com a nossa juventude”. “Eu fico muito emocionado ao saber que a ausência do professor foi transformada em luta em todo o Brasil”, concluiu José Francisco.
Também estiveram presentes na homenagem ao professor Eduardo de Oliveira, representantes das entidades do movimento negro: Fórum de Religiões de Matriz Africana, União de Negros e Negras Pela Igualdade (Unegro), Novos Rumos, SOS Racismo, União das Escolas de Samba de São Paulo (UESP), Quilombação ,Agentes de Pastoral Negros do Brasil (APNs), Nova Frente Negra Brasileira, Conselho da Comunidade Negra do Estado de São Paulo (CPDCN), Coordenação Nacional de Entidades Negras (CONEN), Movimento Negro Unificado (MNU), Círculo Palmarino, EDUCAFRO, UNEAFRO, Fórum Inter-Religioso, além do ex-deputado Jamil Mourad, da ex-candidata ao Senado Cidinha Raiz e a ex-vereadora da capital paulista, Lidia Correa e a Confederação das Mulheres do Brasil.