Cursos pagos ganham espaço na USP e em outras universidades públicas
Cobrança é feita em 59% dos cursos de extensão, como especialização e MBAs
Pró-reitora afirma que cursos atendem demanda de mercado; para Adusp, medida é contra a Constituição
Em quatro anos, o número de cursos pagos na USP –especialização e MBAs– passou de 769 para 831, crescimento de 8%. Quase 28 mil pessoas pagam para estudar na universidade pública.
Para comparação, a universidade tem 90 mil alunos no ensino regular (graduação e mestrado). Os cursos pagos correspondem a mais da metade (59%) das ofertas de extensão na USP.
Entram na lista especialização lato-sensu (os quais incluem MBAs), além de atualização, difusão e práticas profissionalizantes. Neste ano, só até julho, havia 719 cursos em andamento.
A Adusp (associação de docentes) diz que a cobrança fere o princípio constitucional de gratuidade no ensino superior. "Não existe nenhuma brecha legal, muito menos moral ou ética para que a USP tenha curso pago", diz Ciro Correia, presidente da Adusp.
Para ele, há conflito de interesses no convênio com fundações criadas por docentes, mas privadas, e que ofertam cursos com "certificado USP."
Já a pró-reitora de extensão, Maria Arminda Arruda, nega ilegalidade e falta de controle sobre a criação de cursos. Diz que a oferta atende a demandas de mercado.
"A construção da USP é também um projeto para a sociedade. Não quer dizer que ela seja privatizada", diz.
A arrecadação dos cursos também gera debate na universidade, que passa por uma crise financeira. Apenas 5% do valor obtido vai para os cofres da USP. O restante é usado para pagar professores.
De 2010 a 2013, o valor recebido pela USP passou de R$ 2,5 milhões para R$ 4,5 milhões. A USP não informou o total movimentado.
Arruda diz que o dinheiro ajuda a financiar projetos sociais e a ida de alunos e de docentes a congressos.
A maior parte dos cursos é de especialização –47%. Os valores variam por duração e área. Gestão de Projetos, o mais procurado da Politécnica, custa R$ 32.400, divididos em 24 parcelas de R$ 1.350.
O professor Marcelo Pessôa, da Fundação Vanzolini, instituição que mantém nove cursos ligados à Poli, defende a cobrança. "Não tenho a mínima dúvida de que deve ser pago", diz.
Para o professor da USP, Renato Janine Ribeiro, alguns cursos pagos, como de idiomas, deveriam ser gratuitos. "É difícil se formar sem domínio de uma língua estrangeira e informática."
Discussão sobre cobrança chega à Justiça
O debate sobre a cobrança por cursos de extensão se repete em outras universidades públicas do país e já chegou à esfera judicial.
Em São Paulo, o Ministério Público abriu uma ação para investigar a oferta de um curso de mandarim por uma instituição privada dentro da Unesp Guaratinguetá –sem que a universidade, contudo, recebesse repasses.
Debate semelhante ocorre no âmbito federal, onde já há decisões contrárias à cobrança. Em fevereiro, o Tribunal Regional Federal da 1ª Região decidiu que era "ilegítima" a mensalidade de uma pós-graduação lato sensu na Universidade Federal de Goiás, após pedido de uma aluna.
Um recurso de outra ação, mas sobre o mesmo tema, aguarda análise no Supremo Tribunal Federal.
Há também casos na esfera extrajudicial. Em 2007, o Ministério Público Federal recomendou o fim da cobrança por cursos na Unifesp.
A discussão terminou somente após um acordo em 2013. A partir daí, a universidade passou a oferecer bolsas para 50% das vagas.
Hoje, não há regulamentação específica sobre o tema no país. O Conselho Nacional de Educação pretende finalizar a elaboração um marco regulatório sobre esses cursos até o final deste ano.
Até lá, cabe a cada universidade decidir se irá ou não abrir cursos pagos.
Folha de São Paulo
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