Diferença de salário médio de professor e engenheiro pode chegar a R$ 3.600
Levantamento do Todos Pela Educação com dados da Pnad revela abismos entre médias salariais
A diferença entre as médias salariais de um professor de Educação Básica e um engenheiro chega a 3.683,50 reais. Já entre um docente e um profissional da área de biológicas e da saúde, como um médico, a diferença é um pouco menor: 2.612,60 reais. Fazendo a comparação com os trabalhadores formados na área das ciências sociais e humanas, o valor cai um pouco mais, mas continuo expressivo: 2.011,50 reais.
Se a comparação for feita regionalmente, as discrepâncias podem ficar ainda maiores do que na média nacional. É o caso da Região Centro-Oeste, onde o salário médio de um profissional graduado na área de biológicas chega a ser 4.646,80 reais a mais do que o dos professores, que é de 2151,10 reais.
Os dados são de um levantamento feito pela equipe técnica do Todos Pela Educação com base na Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios (Pnad) do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE). Foram considerados apenas professores da Educação Básica com nível universitário.
No ano passado, uma pesquisa internacional mostrou que os docentes brasileiros que lecionam no Ensino Fundamental recebem um dos piores salários da categoria em todo o mundo. O estudo é de autoria da Organização das Nações Unidas (ONU), Banco Mundial e Organização para a Cooperação e o Desenvolvimento Econômico (OCDE) (leia mais aqui).
Valorizar os profissionais do magistério de todas as redes públicas de Educação Básica, equiparando seu rendimento médio ao de profissionais com escolaridade equivalente, é a Meta 17 do Plano Nacional de Educação (PNE), atualmente em tramitação no Senado.
Para Roberto Franklin Leão, presidente da Confederação Nacional dos Trabalhadores em Educação (CNTE), as diferenças são abissais. “Dados extremos como esses mostram a necessidade urgente de a Educação pública brasileira dar um salto de qualidade. Com um salário baixo, não se atrai jovens para a profissão – até aqueles que querem ser professores muitas vezes desistem e optam por carreiras mais rentáveis”, explica.
Para Leão, a lei do piso, sancionada em 2008 (leia o texto completo da lei aqui), foi um grande avanço, apesar de o valor ser considerado baixo (em 2013, é de 1.567 reais) e de municípios e estados ainda não a cumprirem na íntegra. “A lei foi fruto de uma luta e é considerada um progresso, mas não podemos dizer que ela é cumprida em sua totalidade. Os governos precisam compreender que essa legislação é essencial para a Educação”, afirma.
Um plano de carreira sólido e claro e a diminuição de contratos temporários nas redes públicas de ensino, segundo ele, também são essenciais para que a profissão atraia mais candidatos. “O professor deve ter segurança para saber o que esperar do futuro. Além disso, os concursos públicos precisam ser uma realidade no País. Precisamos investir mais”, opina o dirigente.
A necessidade de mais investimentos na Educação e, por consequência, nas políticas salariais dos professores, é quase consenso entre os especialistas. “Existe uma escassez de recursos para a área. Muitos municípios, que são muito pequenos, não conseguem nem aplicar na área a porcentagem do orçamento que a lei manda”, lembra Maria Beatriz Luce, professora do Núcleo de Estudos de Política e Gestão da Educação da Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS). Segundo ela, uma carreira com um salário atraente e sólida diminuiria a quantidade de professores com mais de um contrato, em redes de natureza diferentes, para obter uma renda mensal maior.
Conhecimento em baixa
A falta de valorização do conhecimento na sociedade brasileira é outro motivo que colabora para que a figura do professor perca “valor moral”. “A imagem do professor como autoridade dentro de sala de aula vem se desfazendo – e não apenas no sentido de desvalorização monetária. O professor tem que se legitimar o tempo todo. O sistema não ajuda – ele deve vencer as batalhas sozinho”, afirma Helena Coharik Chamlian, professora aposentada da Faculdade de Educação da Universidade de São Paulo (USP) e pesquisadora na área de formação e desenvolvimento profissional de professores. “Isso fica evidente quando olhamos para os protestos dos últimos meses. Só se vê manifestação pedindo a valorização docente quando é uma manifestação sindical, só de professores, e não da sociedade.”
Processo
Especialista na história da profissão docente no Brasil, a professora e pesquisadora da Universidade Federal de São Paulo (Unifesp), Rosario Genta Lugli, destaca que a desvalorização da profissão tem raízes históricas. “A reclamação sempre existiu. Pesquisando, não se encontra evidência de que, em algum momento da história, os professores estiveram satisfeitos com o salário – muitos, inclusive, definiam-se como ‘mendigos de gravata’”, explica.
Segundo ela, é bastante difícil chegar a uma ideia de bom salário, uma vez que as demandas da profissão foram se alterando no decorrer dos anos. “São momentos sociais diferentes. Nos anos 1950, o professor primário bom era aquele que reprovava. Hoje, o bom é o professor que se atualiza e que, para isso, precisaria gastar com cursos e livros – mas o salário não dá. Os momentos mudam e as necessidades também. Além disso, o cálculo de quanto era um salário decente, que desse para enfrentar a vida de forma digna, em 1920, por exemplo, é uma conta bastante complicada de se fazer”, afirma Rosario.
Leda Scheibe, professora da pós-graduação da Universidade do Oeste de Santa Catarina (Unoesc) e especialista em políticas de formação docente, destaca a feminilização da profissão como um dos fatores de desvalorização. “É uma questão estrutural: a esmagadora maioria dos professores – cerca de 82% – é formada por mulheres e, como se sabe, por muito tempo se teve a ideia arcaica de que a mulher não precisa sustentar a família com o trabalho”, afirma. “Poucos homens procuram a profissão justamente por isso: paga-se muito pouco.”
Os já conhecidos problemas da formação docente no País, segundo ela, também contribuem com grande peso para que a profissão não seja valorizada. “A formação é um dos grandes braços da valorização do professor e deveria ser mais forte, rigorosa, para influenciar também o salário. Hoje, normalmente quem procura os cursos de Pedagogia, tanto presencial como a distância, é quem não tem condições de entrar em cursos de maior valorização salarial.”
Informações: APEOESP e Portal Todos Pela Educação
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