Entre 2006 e 2014 Ensino de Jovens e Adultos perdeu 3,2 milhões de matrículas
O número de alunos matriculados na Educação de Jovens e Adultos tem caído drasticamente nos últimos anos. De acordo com o Censo Escolar da Educação Básica de 2014, se comparado com com as matrículas de 2006, houve uma redução de 3,2 milhões de matrículas na modalidade. “Essa queda mostra uma regressão. Vai na contramão dos direitos educativos já consolidados na nossa legislação”, afirma Maria Clara Di Pierro, professora da Faculdade de Educação da Universidade de São Paulo (USP) e especialista em educação de adultos a Época.
“A EJA é uma ferramenta preciosa para o desenvolvimento de qualquer país”, especialmente o Brasil que tem cerca de 13 milhões de analfabetos. Dados do IBGE de 2014 estimam que o número represente 8,7% da população acima de 15 anos, porém quando o critério é o analfabetismo funcional, os índices são ainda piores: 27% dos brasileiros (cerca de 40 milhões) não compreendem o que leem.
Di Pierro afirma que “falta atitude convocatória do poder público. Mobilizar adultos para estudar é difícil em vários países. Nessa etapa da vida, a educação vai competir com outras esferas prioritárias da vida: trabalho, família, atuação social e prática religiosa, por exemplo. Políticas de EJA demandam comunicação, convocação, mobilização, motivação, o que não acontece no Brasil – apesar de a Lei de Diretrizes e Bases dizer que o governo tem de fazer chamada pública. Com os meios de comunicação que temos hoje, isso poderia ser feito por mensagem de celular, rádio, televisão e internet. O governo, no entanto, apenas publica no Diário Oficial que as matrículas da EJA estão abertas. Obviamente, a repercussão é muito baixa”.
Ela também condena a falta de recursos. “Há inadequação da política pública, a começar pelo financiamento insuficiente. Apesar de a EJA estar incluída no Fundeb, ela tem o mais baixo fator de ponderação, ou seja, é a que menos recebe recursos do financiamento. Uma matrícula em EJA vale 80% do que vale a matrícula de um aluno na primeira fase do ensino fundamental urbano, que tem o maior fator de ponderação. Isso incentiva muito pouco o dirigente de ensino a investir nessa modalidade educacional, já que o adulto estudante custa a mesma coisa ou mais que uma criança ou um adolescente”.
Outro fator importante salientado é o padrão de colaboração intergovernamental inadequado, que impede as adaptações regionais necessárias. “Os municípios, por exemplo, quando assumem o compromisso de aderir ao Plano de Desenvolvimento da Educação [PDE, do governo federal], a única coisa com que se comprometem em relação à EJA é manter um programa de alfabetização de adultos. É pouco. Deveriam assumir o compromisso de lhes garantir educação básica e formação profissional”.
“O governo do Estado de São Paulo, por exemplo. Ele não faz nada para superar o analfabetismo desde 1996. Empurrou a responsabilidade para os municípios. É claro que municípios maiores, como Ribeirão Preto, Campinas e Santos, não precisam dessa ajuda do governo do Estado. Mas há municípios pequenos com índices de analfabetismo nordestinos. Falta uma indução mais efetiva dessa colaboração entre governos. Enfim, é preciso remunerar melhor e cobrar mais as atuações em EJA”.
Outra solução apontada por ela é o ajuste do EJA as necessidades de um público mais velho e maduro. “Eles têm dificuldade em compatibilizar trabalho e escola. Ainda mais onde se perde muito tempo com deslocamentos. Além disso, quais as ofertas de estudo disponíveis? Escolas somente noturnas, com carga horária rigorosa e currículo escolar. O currículo dialoga muito pouco com a cultura e com a necessidade de formação desse perfil de estudante. Enquanto alguém quer terminar os estudos para fazer um curso técnico, outro quer estudar para acompanhar melhor o desenvolvimento dos filhos na escola ou para ler a Bíblia. Um modelo de oferta de educação que reproduz a escola da criança e do adolescente não os atrai”.
“A importância da EJA vai além da lógica do mercado. Não é só para qualificar mão de obra para acelerar o desenvolvimento do país. É especialmente importante para a formação da cidadania. A educação estimula a participação efetiva das pessoas na vida política e cultural, incentiva a relação positiva entre as gerações. São os jovens e os adultos que votam e educam as crianças. A lógica de investir nas novas gerações e esperar os mais velhos morrerem é equivocada. Não é possível esperar as crianças crescerem para o país se desenvolver”.
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