Fim da picada – Walter Sorrentino
Mussolini e seus milicianos, os “camisas negras”, na marcha sobre Roma
WALTER SORRENTINO (*)
O carnaval já chegou e a folia vai desconcentrar-se de assuntos agônicos. Mas seguirá a marcha da deriva do Brasil sob direção de Bolsonaro.
É o fim da picada. Chega uma hora em que quase já tudo foi dito e evidenciado sobre a deriva nacional quando Heleno bate na mesa, Guedes aprofunda sua ligação com o núcleo ideológico do governo, uma testemunha ameaçadora para o clã que tomou conta do país é assassinado obscuramente, o presidente se mostra um ser grotesco, inepto para governar, o senador Cid Gomes é baleado… Veríssimo foi certeiro: o Brasil está sendo apatifado.
A lista do arbítrio, da destruição do Estado, do esgarçamento do tecido social e do avanço das milícias e do neopentecostalismo para-estatal já tem dimensão histórica inédita. O desemprego, a violência, as condições do serviço público em geral, a indignação com as desigualdade crescentes, destruição do patrimônio público, a economia em depressão – tudo isso vai se acumulando na panela de pressão, mas não encontra escoadouro e consenso na maioria da sociedade.
Entretanto, a escalada autoritária é a marca central hoje no Brasil. Vozes se alevantam – felizmente – contra esse estado de coisas, inclusive na grande mídia, nas instituições e em setores conservadores, porém democráticos. Esse governo é inviável se mantiver o arcabouço institucional formal ainda vigente. Se há algum consenso maior, é esse, e a maioria do povo será capaz de entendê-lo.
Entretanto, o que não foi dito – aquelas coisas que também entram para a história – é por que a maioria da esquerda brasileira se recusa a entender o grau das ameaças autoritárias e a unir-se para liderar a luta lado a lado com amplos setores para barrar essa insanidade, isolar e derrotar Bolsonaro no terreno da luta por um Estado democrático de direito, em defesa da Constituição.
Muitos na esquerda estão perdidos em abstrações pensando em 2022 – que país haverá até lá? Que hegemonia pode ter uma esquerda que não se disponha a sair das montanhas escarpadas e ir para a planície, onde está a maioria dos brasileiros de todos os credos e inclinações políticas, para uma mensagem de esforços em comum para esconjurar o perigo autoritário e permitir, aí sim, que se reponha o pacto democrático para as disputas inevitáveis de rumos para o país? Bem vistas as coisas, estamos às voltas com uma crise que acomete tais forças da esquerda. O custo disso será elevado!
*Walter Sorrentino é vice-presidente do Partido Comunista do Brasil (PCdoB). Publicado no Jornal Hora do Povo.
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