Se PLS de Renan fosse lei, até o juiz Sérgio Moro se tornaria réu
Procuradores também mobilizam contra o PLS 280 que visa abafar a Justiça e estimular os corruptos
CARLOS LOPES*
O projeto de lei nº 280, apresentado pelo presidente do Senado, Renan Calheiros – com a cumplicidade do ministro Gilmar Mendes, do STF, que exumou um texto arquivado pela Câmara -, foi definido pelos procuradores Antonio Carlos Welter e Carlos Fernando dos Santos Lima, da Operação Lava Jato: “pretende-se transformar em lei a vontade do criminoso de prender quem o investiga”.
O projeto proíbe a delação premiada daqueles que estiverem presos (artigo 11º) – e até dos que estiverem soltos, mas alegarem que estavam sob ameaça de prisão (artigo 13º); proíbe a escuta ambiental das próprias conversas – como aquelas feitas pelo ex-presidente da Transpetro, Sérgio Machado, ou pelo filho do ex-diretor da Petrobrás Nestor Cerveró (artigo 22º); torna impossível a prisão preventiva de acusados, ao tornar automática sua “liberdade provisória” (artigo 9º); e até estabelece ações privadas, cassando a prerrogativa do Ministério Público de oferecer denúncia por suposto “abuso de autoridade” (artigo 3º). A pena, para cada uma dessas “infrações”, seria de um a quatro anos de cadeia, mais multa.
É óbvio o motivo de apresentar agora esse projeto e querer aprová-lo a toque de caixa, sem passar pelo plenário, em caráter “terminativo”, na comissão do senador Jucá – como Renan, um dos investigados por corrupção. A tentativa, por sinal, fracassou. Com o pedido de vistas coletivo dos membros da comissão, a apreciação do projeto foi adiada para 16 de agosto.
Mas o fato é que, se esse projeto fosse lei, os policiais, procuradores e até o juiz Sérgio Fernando Moro, teriam se tornado réus por suposto “abuso de autoridade” – e os ladrões do dinheiro e do patrimônio do povo estariam livres para continuar sua carreira de crimes contra o Brasil.
Não há maior abuso de autoridade do que este.
Como dizem os procuradores da Lava Jato: “…pretende-se, não apenas calar investigadores e juízes, mas paralisar investigações de criminosos do colarinho branco, especialmente aqueles que possuem poder político e que durante anos se beneficiaram de um vasto esquema de corrupção”.
Quem são os apoiadores desse projeto, cujo único objetivo é impedir que alguns ratos da República – de rabo grosso e de rabo fino – vão para a cadeia, tornando réus, em seu lugar, os policiais, procuradores e magistrados que fazem parte da Lava Jato e outras investigações?
Os principais apoiadores são: além de Calheiros – denunciado, entre outras coisas, por um roubo de R$ 32 milhões na Transpetro (a frota da Petrobrás); Lula – denunciado por falcatruas com empreiteiras que lhe proporcionaram um sítio, um triplex e palestras muito bem pagas para dizer platitudes; Cunha, elemento já com meio pé na cadeia; Collor, que já está com meio corpo dentro do mesmo lugar, por roubos na BR Distribuidora; Gilmar Mendes, segundo dizem, ligado a José Serra. Faltam outros, mas essa é uma amostra suficiente, porque muito representativa.
A QUEM
Os antigos romanos – em especial, Sêneca – diziam: “Cui prodest scelus, is fecit”, ou seja, “aquele que se beneficia com o crime foi quem o cometeu”.
A quem beneficia o projeto nº 280? Aos ladrões da Petrobrás: aos Renan, Cunha, Lula, Collor, etc.
Aliás, Calheiros está tão desesperado com a perspectiva da cadeia, que, na terça-feira, ameaçou o senador Cristovam Buarque (PPS-DF), durante a sessão do Senado:
CALHEIROS (PMDB-AL): Outro dia, vi uma declaração do Senador Cristovam fazendo a interpretação de que talvez o Presidente do Senado, por atender a esse pedido do Supremo Tribunal Federal [do ministro Gilmar Mendes], o faça por motivações pessoais. (…) essa motivação V. Exª não verá em mim jamais, jamais, jamais. A lei não retroage, não tem nada a ver com as investigações.
CRISTOVAM (PPS-DF): Senador, (…) fala-se em abuso de autoridade, mas, na verdade, muitos estão imaginando que é abuso contra autoridade – é isso que se imagina – até porque morrem 10 mil crianças assassinadas, e a gente nunca fez nada aqui no sentido de se preocupar com isso. Todos os dias, são algemados centenas de pobres, quase todos negros, e a gente não fala nada contra abuso de autoridade. (…) neste momento, ao trazer esse projeto, a sensação geral é que, de fato, os senadores querem é se proteger. Como foi o senhor que trouxe, fica mais ainda sobre o senhor.
CALHEIROS: (…) quando foi que V. Exª disputou a eleição presidencial?
CRISTOVAM: Em 2006, em 2006.
CALHEIROS: Em 2006, eu lembro aqui que nós fomos procurados pelo então tesoureiro do PDT, que trazia denúncias (…) de doação ilegal, de receptação não contabilizada na campanha.
CRISTOVAM: Presidente, e o senhor não fez nada? O senhor pecou, então. É grave. Se chegou uma denúncia…
CALHEIROS: Eu não pequei. Eu acho que essas coisas não prescreveram.
(…)
CRISTOVAM: Muito bem! O senhor tem que apurar, Presidente.
CALHEIROS: (…) Quem sabe se não será hoje?
CRISTOVAM: Não! Tinha que fazer e eu acho que deveria levar para o Conselho de Ética.
CALHEIROS: … eu nunca levei em consideração, porque eu acho que as delações precisam ser regulamentadas.
CRISTOVAM: Então, desculpe-me pela palavra certa: o senhor prevaricou. Se chegou uma denúncia aqui contra mim, e o senhor não apurou, isso se chama prevaricação, presidente Renan. Tinha que ter aberto o Conselho de Ética. Tinha que levar todo tipo de investigação.
(…)
CALHEIROS: (…) queria repetir que a primeira delação que eu vi, no Brasil, foi sobre as eleições de 2006.
CRISTOVAM: Então, vamos apurar, senador! Como o senhor deixou isso guardado?
CALHEIROS: Não fui eu, eu não era presidente do Senado.
CRISTOVAM: Mas era senador, tinha obrigação de apurar.
CALHEIROS: Está na hora.
(…)
CRISTOVAM: É mais uma razão para eu ficar contra essa lei…
CALHEIROS: Não tem nada a ver com a lei.
CRISTOVAM: É para não virem dizer que estou querendo me proteger, senador. (…) O senhor prevaricou! O senhor prevaricou!
CALHEIROS: E o senhor? E o senhor?
CRISTOVAM: Eu não prevariquei!
CALHEIROS: Se eu prevariquei, o que é que aconteceu com o senhor?
CRISTOVAM: Eu não prevariquei. O senhor apure, senador. Vou pedir que se apure agora oficialmente.
E Renan mudou de assunto: passou para a ordem do dia.
*é editor chefe da redação da Hora do Povo
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