A carreira de Eduardo Cunha, sobretudo nos últimos anos, é uma das demonstrações mais evidentes, mais escandalosas, do apodrecimento do atual sistema político-eleitoral, cada vez mais antidemocrático, cada vez mais antinacional, cada vez mais antipopular. Comparável ao fato de um bandido chegar à presidência da Câmara – terceiro na linha de sucessão da Presidência da República – somente há o apodrecimento público da cúpula do PT. Aliás, um apodrecimento se alimentou do outro, num estranho processo que variava entre a simbiose e o parasitismo.
A prisão preventiva de Cunha, decidida pelo juiz Sérgio Moro, foi recebida com satisfação – e mesmo euforia – em todo o país. A exceção foram os sequazes de Cunha, o sr. Renan Calheiros e o PT.
Os primeiros, por razões óbvias.
RENAN
Quanto a Renan – que declarou: “preciso me abster de comentar; eu não sou especialista em Eduardo Cunha, vocês são mais do que eu” -, sua necessidade é que ninguém lembre que ele e Cunha foram, na mesma época, da quadrilha de Collor. Suas carreiras foram tão paralelas que acabaram na presidência das duas casas do Congresso no mesmo momento – e com feitos quase idênticos.
Se há um sujeito que entende de Cunha, é Renan. Além do que, é presidente do Senado e do Congresso – mas isso é, outra vez, uma vitrine da podridão que acomete hoje os meios políticos dos partidos governistas e recém-governistas: PMDB, PT, PSDB, Dem, e alguns satélites.
Renan, evidentemente, só não é vizinho de Cunha em Curitiba pela morosidade crustácea que impera no STF – como tem “foro privilegiado”, o juiz Moro não pode tomar as providências. Com nove inquéritos sobre seus malfeitos e depoimentos, como o de Sérgio Machado, mostrando a sua participação farta e ampla no festival de propinas dos últimos anos, somente essa morosidade do STF pode explicar que Renan ainda esteja solto – e sentado na cadeira onde homens ilustres já honraram o país. Aliás, sobre isso, Renan como presidente do Senado, em si, já é a própria esculhambação das instituições republicanas.
O PT é um caso quase engraçado. Depois de passar uma ou duas semanas garantindo que a prisão de Lula era iminente, porque o juiz Moro é um “seletivo”, um Torquemada que só persegue o PT, a cúpula petista, e os bobos em torno dela, tiveram a surpresa de ver a prisão de Cunha – justamente aquele que acusaram de ser o articulador e mentor (?!) do suposto “golpe” contra Dilma.
Como sustentar agora que Moro é “seletivo” e só persegue o PT?
Ora, leitor, segundo os petistas, a prova de que Moro é “seletivo” e persegue o PT, é que optou por prender Cunha. Claro que só pode ter sido para disfarçar e “abrir espaço” para prender Lula. Que outro motivo haveria para prender Cunha? Só por ele ser um bandido, um chantagista e um ladrão? Ora…
Dessa forma, Moro pode fazer qualquer coisa – inclusive o que está fazendo: remetendo ladrões para a cadeia – que sempre estará perseguindo o PT, mesmo que prenda aquele que os petistas apresentavam como o maior inimigo do PT, isto é, Cunha.
Que isso seja uma presepada ao estilo fascista, que não respeita a realidade nem a inteligência das pessoas – e que, apesar disso, todos percebam que é uma presepada – não parece importante para eles. Talvez porque, no fundo, seu negócio é, realmente, defender a impunidade dos ladrões que assaltaram a Petrobrás e outras propriedades públicas.
Mas, dizíamos, fora esses tipos de réprobos, o país se sentiu satisfeito e até eufórico com a prisão de Cunha. Como disse o juiz Moro:
“… excepcional não é a prisão cautelar, mas o grau de deterioração da coisa pública revelada pelos processos na Operação Lavajato, com prejuízos já assumidos de cerca de seis bilhões de reais somente pela Petrobrás e a possibilidade, segundo investigações em curso no Supremo Tribunal Federal, de que os desvios tenham sido utilizados para pagamento de propina a dezenas de parlamentares, comprometendo a própria qualidade de nossa democracia” (v. Juiz federal Sérgio Moro, Despacho/Decisão, Prisão Preventiva de Eduardo Cosentino da Cunha, 17/10/2016, p.17).
Moro faz uma história dos crimes de Eduardo Cunha que até agora estão sob investigação:
1 – A propina de US$ 1,5 milhão, por ter armado a compra, pela Petrobrás, por US$ 34,5 milhões, de 50% de um campo de petróleo onde não havia petróleo, na República do Benin. A prisão preventiva de Eduardo Cunha foi decidida no âmbito desse processo.
2 – A chantagem, em cima do Grupo Schain, para extorquir dinheiro, no rompimento da Central Hidrelétrica de Apertadinho, em Rondônia, tendo como intermediário o doleiro Lúcio Bolonha Funaro.
3 – A propina de US$ 5 milhões, recebida por Cunha sobre contratos da Petrobrás para fornecimento dos navios-sonda Petrobrás 10000 e Vitória 10000.
4 – As propinas recebidas da Odebrecht, OAS e Carioca Christiani Nielsen Engenharia, nas obras do Projeto Porto Maravilha (a recuperação da área portuária do Rio de Janeiro), com lavagem de dinheiro.
5 – O abuso de poder na apresentação de requerimentos no parlamento para extorquir adversários do intermediador de propinas Lúcio Bolonha Funaro, em Furnas.
6 – A propina, no valor de 1,5% de títulos comprados pelo FI-FGTS, paga em 36 parcelas. A primeira transferência de dinheiro foi para o Israel Discount Bank, no valor de quase US$ 4 milhões.
7 – Propina de R$ 45 milhões, recebida por Cunha do banco BTG Pactual, de André Esteves, em troca da apresentação de emendas em Medidas Provisórias para beneficiar bancos em liquidação.
8 – Crimes de corrupção passiva em contratos de Furnas.
9 – Desvios de fundos de investimentos administrados pela Caixa Econômica Federal.
CONTAS
Além disso, Cunha controla as seguintes contas, até há pouco secretas, no Banco Julius Baer, em Genebra, Suíça: Orion, Triumph, Kopek – a conta que abastecia os cartões de crédito de sua mulher – e Netherton, usada para “novos negócios”.
Além disso, Cunha controla ou controlava as contas Korngut Baruch (no Israel Discount Bank, de Israel), Esteban García (no Merrill Lynch Bank, EUA), Penbur Holdings (no BSI, Suíça) e Lastal Group (no Bank Heritage, Suíça) .
Não listaremos as empresas-fantasma de Cunha, pois sua função é apenas manter uma ou mais contas em bancos no exterior. Com exceções, os nomes das contas são os nomes das empresas-fantasmas.
Em seguida, Moro relata as tentativas de Cunha de impedir as investigações e a possível tentativa de fuga, facilitada por sua dupla nacionalidade (Cunha tem cidadania italiana), o que justifica sua prisão preventiva.
É esse escroque que, agora, o PT lamenta a prisão – tudo não passa de uma conspiração, dizem eles.
Uai, mas o conspirador não era o Cunha?
Fonte: Carlos Lopes da Hora do Povo